Quando
criança Albert sempre gostou de historias de ficção científica. Adorava deitar
para dormir e ouvir seu pai, sempre entusiasmado, lhe contar incríveis atos que
desafiavam sua mente. Mesmo que fosse difícil fechar os olhos depois de tanto
mistério e fantasia, Albert pedia uma nova história todos os dias. Nunca
poderia imaginar que as aventuras vividas ali abririam portas que nunca mais
poderiam ser fechadas.
Albert
com seu jaleco branco e seus óculos tradicionais, anotava com toda facilidade
uma fórmula científica no quadro negro a sua frente e nem havia percebido que
seu filho Eduardo tinha chegado e estava ali, parado na porta do laboratório.
-
O Senhor deveria parar e descansar um pouco! - dizia Eduardo ao olhar com toda
admiração para o pai.
Albert
apenas olhou de relance e continuou a escrever no quadro negro.
-
Estou prestes a concluir uma experiência importante e não tenho tempo para
mordomias.
Eduardo,
cabisbaixo, começou a mexer em alguns livros que estavam jogados sobre uma
escrivaninha.
-
Estou falando sério, pai. O senhor tem que dar um tempo e fazer algo de
diferente. Já faz um ano que a mãe morreu e parece que você ainda está de luto.
-
Já chega – gritou Albert, jogando o giz no chão.
Eduardo
deixou o laboratório sem dizer mais nenhuma palavra. Em poucos minutos só se
ouviu a porta da casa se fechar e o ronco do motor de seu carro.
O
tempo era fundamental e para Albert cada minuto era crucial para a eficácia de
sua experiência. Após a morte de sua esposa muitos foram os dias de luto e lágrimas
derramadas. Depois de várias pesquisas e horas de sono perdidas, surgia uma
chance de fazer contato com ela novamente e para isto ele construiu uma máquina,
diferente de todas as outras, em seu laboratório.
Entre
muitos fios e luzes que se acendiam e se apagavam, um painel pequeno chamava a
atenção, parecido com um monitor de televisão que não possuía tela propriamente
dita, emanava pequenos raios de eletricidade entre uma ponta e outra. No
momento em que Albert ligou os disjuntores da máquina, os raios dobraram de
espessura e uma luz azulada tomou conta do ambiente. Após alguns segundos, os
raios se estabilizaram e uma imagem distorcida começou a se formar no painel.
Albert retirou os óculos de segurança e com os olhos atentos sorriu diante da
figura à sua frente.
-
Milena – disse Albert com a voz baixa.
Com
toda calma Albert se aproximou da imagem e com uma das mãos tentou tocá-la,
neste momento ela sofreu uma pequena distorção, mas ainda assim continuou sendo
transmitida.
Os
detalhes da imagem ficavam cada vez mais nítidos e o que antes não poderia ser
percebido, agora estava claro para os olhos de Albert. Milena usava óculos
diferentes dos quais ele se lembrava. Além disso, o olhar de sua esposa
aparentava certa preocupação, uma tensão que nunca fez parte de seu feitio.
Outra imagem também estava mais nítida na transmissão que se seguia: Milena
estava em um local parecido com sua casa, mas que possuía alguns móveis e
utensílios domésticos diferentes.
A
incerteza e a veracidade daquela transmissão começou a ser questionada na
cabeça de Albert, para ele as imagens que estavam sendo transmitidas não eram
mais de sua esposa falecida, mas de algo diferente, que ainda não poderia ser
explicado por ele.
A
dúvida virou inquietude e a inquietude se transformou em ação. Durante a noite,
Albert revirou livros, artigos e sites
sobre física para buscar uma explicação plausível para o fato que presenciou e
que tirou seu sono. Depois de muito pesquisar, enquanto lia um artigo em um site de ciência, ele se deparou com o
termo “Universos Paralelos” e aquilo lhe soou muito familiar. Em uma
fração de segundos Albert formulou uma teoria para os resultados de sua
experiência. E ele sorriu. De repente tudo fazia sentido. E ao olhar para trás
e ver aquela máquina estranha, ele se orgulhou, não de si próprio por ter
conseguido contato com outro universo, mas de fazer parte de um mundo em que a
ciência, mais dia ou menos dia, poderia explicar tudo com seus números e
teorias.
Em
pé ao lado da máquina, Albert assistiu pacientemente às imagens transmitidas
por sua criação e começou a questionar as diferenças, tantos físicas como de
comportamento, de Milena. Viu que as duas eram completamente opostas: sua
esposa era do tipo de mulher que fazia um homem sorrir ao observar ela sorrindo
e que mesmo nos momentos de tensão entre o casal ela conseguia manter-se doce e
meiga, podendo conquistar tudo que ela quisesse apenas com seu olhar. Ele
chorou ao lembrar que não estava presente nos últimos dias de vida dela. Era
viciado em trabalho. Nunca teve tempo para ela.
Eduardo,
que tinha entrado sorrateiramente no laboratório e não estava entendo a
situação, também chorou ao ver as imagens de sua mãe.
-
Você ainda sente muita falta dela, não é?
Assustado
Albert se virou para a porta do laboratório.
-
Eduardo! – dizia ele enquanto enxugava os olhos que estavam cheios de lágrimas.
-
Você ainda não conseguiu se acostumar com a perda dela!
-
Não é isso meu filho... – dizia Albert indo até o encontro dele. – Você não
esta entendendo, essa é a minha experiência e...
-
Pai. Não precisa se explicar. Sei que a morte dela foi prematura e que foi
difícil nos primeiros dias, mas está na hora de virar a página do livro e
seguir em frente. Não sei nada sobre sua experiência e na verdade nem importo
muito com ela, o que sei é que existem muito mais coisas para se viver aqui,
neste mundo, no nosso mundo. – dizia
Eduardo indo até a escrivaninha e deixando sobre ela um objeto pequeno antes de
se virar e ir de encontro à porta do laboratório.
Rapidamente
Albert foi até a escrivaninha e, ao pegar o objeto na mão, viu que se trata de
uma medalha ganha por seu filho. Olhou novamente para Eduardo e se recordou que
não estava presente nos principais momentos da vida dele.
-
Filho...
Eduardo
antes de ir embora se virou e olhou para o pai, que correndo o abraçou e chorou
sobre seus ombros.
–
Me desculpe por tudo, nunca tive a intenção...
Abraçado
com seu filho, Albert olhou mais uma vez para a máquina que criou, desligou os
disjuntores e, antes de sair, apagou as luzes do laboratório.
-
Adeus minha querida...
Richard Montezino
Araraquara, 13/08/2011